Controle
Eu não queria que você se acostumasse, e nem eu. Mas desde sempre nossos corpos já tentaram manter esse repelir natural.
Não havia um dia sequer que eu tocasse em você sem aquela sensação estática de choque.
Não havia uma noite sequer que você não trocasse de cama durante a madrugada para que suas últimas horas de sono fosse sozinho, sua forma de já se acostumar com minha ausência.
Você às vezes demonstrava seu carinho me pegando com mais força e eu tentava ignorar que às vezes você me machucava.
A gente vivia uma pressa entre nós. Tudo era afobado, desesperado.
Hoje em dia percebo que agora completamos mais tempo separados do que realmente o quanto ficamos juntos. Sei que quando as coisas são rápidas e intensas demais em um curto período elas tendem a acabar instantâneas na mesma velocidade, se extinguir. Mas eu não enxergo isso na gente, eu não sinto que seja esse nosso destino.
Sei que sempre senti como te conhecesse pela vida inteira, mas às vezes me vejo esquecida de algumas coisas, hoje me peguei tentando lembrar se a gente andava de mãos dadas, por que não consigo me lembrar desse detalhe?
Não queria que nossa rotina e os dias passando normalmente como se nada tivesse acontecido nos afastasse um do outro, mais do que a distância física. Nos fizesse esquecer, substituir…
Se a vida fosse mais difícil e impossível sem você, e de você por e para mim, a gente faria de tudo para estarmos juntos de novo o quanto antes.
Mas a gente parece ser capaz de aguentar e passar por toda e qualquer dor. Ao ponto de um dia não nos querermos mais. É esse o meu medo, não apenas passar a dor, a necessidade, mas passar o próprio sentimento de amor.
Eu queria que nosso desespero de não estarmos juntos agora fosse o mesmo desespero que carregávamos quando estávamos juntos.
Hoje o tempo é nosso inimigo, o cotidiano e a rotina. Logo eles que haviam sido nossos aliados, nossos motivos, logo esses fatores que nos uniram, são hoje o que nos separam.
Vamos adiando e empurrando o amor para os cantos do dia, para o canto dos quartos. A gente se convence e aprende a dizer que não importa de todo.
Desde o começo a gente dizia para nós mesmos que não era amor, até o momento que isso fugiu de nosso controle, até o momento que não havia como deixar de ser, ou não ser, que não havia nada que pudéssemos fazer, então nossos apelos viraram segredos de autoconvencimento, repetições em lavagem cerebral.
Eu tentava dizer que já havia amado mais antes e que por isso não havia como amar de novo, e você dizia que não havia amado ninguém antes e que por isso conseguia continuar assim.
Mas a gente só podia controlar essa parte da fala, e não do verdadeiro sentir.
A gente disse muita coisa, nos magoamos, nos ofendemos, tentamos contornar, fugir, nos enganar, tentamos desgostar um do outro enquanto ainda dava tempo.
Dizer e repetir que não importava, que não abalaria, tentar manter controle de tudo, e um do outro.
E hoje, nos falamos todos os dias, até quando você falou que era melhor pararmos e que não devia ser assim, você me pediu e foi você mesmo que acabou não seguindo o que disse, e eu às vezes queria que parássemos, mas jamais pedi.
A gente continua tentando controlar, e manter o controle
A gente se amou com uma ‘deadline’ e uma linha de chegada, a gente sabia a data do nosso fim.
Eram limites no tempo, mas não do sentimento, do amor em si.
A gente não controlava, não contava (e não saberia contar) com isso.
Isadora Mello
Brasília, 20.03.2019
Texto: Isadora Mello
Imagem: colagem de imagens da internet por Isadora Mello